quinta-feira, 20 de maio de 2021

Verbalizar

 

Pelos caminhos tortuosos da fala libertam-se desejos de concordância. Pela fala e todo o seu acumulado de sons ancianos exprime-se imagem e ideia, procura-se o interpretar das emoções, afia-se o silex da lógica. Pelo som do meu choro, alimento o medo no homem mas pelo som do meu riso convido-nos à cumplicidade propria do sentimento ebriático e fraternal de quem provém da mesma génese.

Pela voz comanda-se acções e contracções, promove-se o estandarte e a cor. Uma voz pelo destino de tantos, uma ideia presa à linguagem que a molda e transforma. O metal macio com que se forma alianças e se destrói impérios. A vontade aliada ao som, como as trompas de jericó aliadas à fé de quem as empunha. 

 O que queremos uns dos outros valida-se e mente-se em canção aberta, diálogos e monólogos tão velhos como o tempo que os constroem. Procura-se veracidade no conto popular, na repetição das gerações dentre o legado que a torre de babel nos deixou e hermes fez acreditar. É isto que chamamos lingua, e os seus derivados, o amparo do homem ou a volúpia do seu ego.